Por que falar da autonomia do trabalho pericial?

Ontem (20) na Comissão de Fiscalização Financeira e Orçamentária da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, o PLC 65/2021, que contém a nova Lei Orgânica da Polícia Civil de Minas, recebeu 33 emendas e, a pedido do deputado Ulysses Gomes e demais membros da Comissão, foi adiada a discussão para descortinar novas e diferentes soluções de aspectos importantes na nova Lei Orgânica da PC.  O trabalho pericial é um deles

A independência, autonomia e imparcialidade da perícia técnico-científica são primordiais para perícia criminal eficiente e ágil. Protocolos técnico-científicos garantem a produção de provas, com maior isonomia e autonomia da atividade pericial. As Políticas públicas voltadas para a perícia criminal autônoma assegura direitos humanos aos indivíduos e condições adequadas de atuação dos peritos no exercício da sua atividade laboral.

Nessa linha, a Perícia Oficial de Natureza Criminal mineira sempre cultivou o desejo de ampliar a qualidade dos serviços prestados ao cidadão.  Assim, para que haja a eficiência do trabalho pericial, requer a premente necessidade de uma autonomia funcional, técnica e científica, que resguarda o perito oficial a quaisquer tipos de ingerência, quer seja de natureza científica, técnica ou administrativa, sobre o seu trabalho, quando no exercício de suas atividades fins. (Mazzilli, 1996). 

No Brasil, segundo  aponta o Relatório sobre a autonomia da Perícia Técnico-Científica no Brasil (Medeiros, 2020), atualmente, dos 27 estados federativos,  18 estados (Alagoas, Amapá, Bahia, Ceará, Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Pará, Paraíba, Paraná, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Rondônia, Santa Catarina, São Paulo, Sergipe e Tocantins) têm a perícia técnico-científica autônoma da Polícia Civil, mas vinculada à Secretaria Estadual de Segurança Pública, como Polícia Técnico-Científica. Já em outros nove estados (Acre, Amazonas, Distrito Federal, Espírito Santos, Maranhão Minas Gerais, Piauí, Rio de Janeiro e Roraima), a perícia funciona como um departamento ou superintendência dentro da própria Polícia Civil, salvo em Roraima cuja nomenclatura é Polícia Científica, mas segue vinculada à Polícia Civil.

A autonomia da Perícia Criminal brasileira tem sido discutida exaustivamente pelo poder executivo e legislativo nos estados, em diversos outros fóruns, especialmente no âmbito do Supremo Tribunal Federal (STF), em que a atividade pericial é reconhecida como atividade de Polícia Científica, dentro do rol das forças de segurança, previsto no artigo 144 da Constituição Federal. Tal reconhecimento da Polícia Científica deixa evidente, que esta atividade goza de pleno embasamento legal, estando ou não sob a égide da Polícia Civil, garantindo segurança jurídica a atividade de perícia oficial no Brasil.

Por isso, a Luta por autonomia por esta entidade sindical não é mero achismo ou vaidade. Trata-se, como aponta o Relatório de Medeiros (2020), de uma recomendação de vários organismos nacionais e internacionais que atuam em DEFESA DA JUSTIÇA e DOS DIREITOS HUMANOS, tais como Organização das Nações Unidas (ONU), Ministério Público Federal e Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

O Sindicato dos Peritos Criminais de Minas Gerais,inclusive, vem alertando há mais de uma década para os riscos causados pela interferência no trabalho pericial, bem como o latente sucateamento, acúmulo de trabalho, baixo efetivo e a crescente queda de qualidade do trabalho pericial.  O cenário desolador, provocado por más gestões, resultou na ausência de imparcialidade, assim como falta de investimentos necessários e pontuais na Polícia Técnico-Científica mineira.

 Já os Estados em que a perícia é autônoma são perceptíveis as beneficies alcançadas pelo Institutos de Criminalísticas, com investimento em insumos e condições de trabalho, a fim de trazer mais segurança e independência no exercício da investigação. A aprovação da proposta de autonomia das instituições de perícia criminal, não visa interesses individuais. Ao contrário, fornece serviço público de qualidade à população.

Assim, Medeiros aponta que cada estado tem decidido e implementado de forma separada e independente como e onde vincular os órgãos de perícia criminal e seus peritos. Porém alerta que para o perito desenvolver seu trabalho de maneira mais isenta possível, a atuação do trabalho pericial deve se pautar impreterivelmente na autonomia.  Isso significa, segundo o Relatório, que a Perícia Criminal subordinada a agentes não peritos, pode ocasionar ingerências na produção das provas, com os órgãos vinculados à Polícia Civil, ou até mesmo as Secretarias de Segurança Pública.

No Brasil, a polícia investigativa tem sua centralização na autoridade policial, os delegados de polícia. Estes, por sua vez, remetem seus trabalhos a uma autoridade criminal, os promotores de justiça. Os peritos médicos legistas, criminais e papiloscopistas têm seus laudos frequentemente submetidos ao fluxo de documentos que se centraliza nestes agentes, segundo a autora.  Porém, a hierarquização dos papéis institucionais em relação aos delegados, conforme aponta o relatório (2020), “coloca os agentes periciais em uma posição de ingerência nas produções de laudos, afinal, enquanto pareceres técnico-científicos, encontram-se submetidos e envolvidos em uma série de outros elementos que compõem o inquérito policial”.

Por essa razão, a busca por uma autogestão em caráter emergencial se faz salutar, pois, a partir de uma autonomia administrativa, técnica e financeira, gerida pelos próprios Peritos Oficiais, é possível combater ingerências no trabalho pericial e conter gastos de custeio (evitando-se aquisição de equipamentos e materiais desnecessários/inadequados ao funcionamento da Instituição e, em consequência, uma má aplicação do dinheiro público).

REFERÊNCIAS

MEDEIROS,Flávia.Políticas de Perícia Criminal na garantia dos Direitos Humanos. Relatório sobre a autonomia da Perícia Técnico-Científica no Brasil, 2020. Disponível em: <https://pt.scribd.com/document/535537342/MEDEIROS-Flavia-Politicas-de-pericia-criminal-na-grarantia-dos-direitos-humanos-relatorio-sobre-a-autonomia-da-pericio-tecnico-cientifica >. Acesso em: 15 de junho de 2022